Os diminutivos e chamegos que se aplicam aos bebês, definitivamente, não valem para os idosos. Carinho e atenção não precisam vir acompanhados da infantilização, e a regra vale – ou deveria valer – para todos aqueles que se relacionam ou cuidam de pessoas com idade mais avançada.
Os alertas são da psicóloga Simone Manzaro, especialista em atendimento a idosos em contexto de fragilidade. Membro da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz), ela atua com estimulação cognitiva para pessoas com demência, além de ajudar famílias a formular estratégias de cuidado para parentes vulneráveis.
Infantilizar o parente ou o paciente – no caso de profissionais -, é uma forma de violência, Manzaro pontua.
O que é uma velhice infantilizada?
velhice infantilizada ocorre quando não se permite que o outro, independentemente do seu estado de saúde, viva a sua fase de desenvolvimento de forma digna, plena de capacidades, potencialidades, regredindo-o a um estado infantil, enfatizando uma condição que essas pessoas não têm.
É comum a confusão dessa forma de tratamento com carinho ou delicadeza?
É preciso deixar claro que infantilizar e tratar com carinho são considerações distintas. A infantilização é considerada uma violência emocional.
Em que condições esse comportamento de quem lida com o idoso é mais visível mais prejudicial?
Claramente, quando há fragilidade, e a experiência do envelhecimento é de abandono. Na maioria das vezes, mesmo sem se dar conta, os familiares e cuidadores acabam por conduzir essa situação como algo natural, o que não é. Mas, até por desconhecimento do quão prejudicial pode ser, esses familiares e cuidadores tratam a pessoa idosa como criança, literalmente. A infantilização, é importante ressaltar, é prejudicial em qualquer contexto.
Essa é uma queixa comum também nos consultórios?
Não é uma queixa, mas uma observação notória e recorrente tanto em consultório como em visitas domiciliares feitas por profissionais. São poucos os familiares que têm consciência sobre essa forma de tratar os velhos. Geralmente, quando ocorre, são sempre os mais jovens, como netos e sobrinhos, que relatam a forma infantil como tratam o seu ente querido.
Como devemos tratar uma pessoa idosa, então?
Eu prefiro referir-me a eles como “idosos” e não velhos. Idoso é qualquer indivíduo acima de 60 anos. E esse é um termo que substitui ‘velho’ e ‘velhote’ e enaltece o idoso como sujeito do envelhecimento. Devemos tratar o idoso como alguém que passou por todas as fases do desenvolvimento humano e que ainda, está ali, ocupando o seu lugar, com muitas histórias e experiências para contar, com grandes potencialidades. Ele não está ali apenas esperando o fim chegar. Gostar ou não de ser ‘velho’ depende muito de como essa pessoa viveu, dos bons hábitos de vida que levou, das boas lembranças que acumulou e de como chegou a essa fase da vida. Alguns gostam, outros não.
Até onde os fatores culturais influenciam no tratamento dispensado por cada grupo ou sociedade aos seus idosos?
A forma como a pessoa idosa é tratada e cuidada depende muito da cultura em que ela está inserida. Na cultura oriental, por exemplo, os idosos são vistos como um símbolo de sabedoria, o que os torna muito mais respeitados. Diferentemente, na cultura ocidental, a pessoa idosa não é tão valorizada, tampouco respeitada, porque a visão que se tem é de alguém que já perdeu o seu papel social. Essa visão contribui expressivamente para o processo de infantilização.
No Brasil, para onde caminhamos?
O Brasil segue em aprendizado para lidar com pessoas idosas, já que faltam políticas públicas eficientes que possam trazer e garantir mais dignidade para a pessoa idosa, garantindo seus direitos na medida em que envelhecem. É ; permitir que os idosos tenham autonomia sobre suas vidas e amenizar os efeitos da infantilização. Acredito que, de alguma forma, caminhamos. É claro, ainda existe muita coisa a ser feita. Afinal, somos nós os responsáveis por cuidar dos nossos idosos.
POR MARIA DA LUZ MIRANDA